A região conhecida pela rainha branca Chardonnay
Já contei em outras matérias, que a região de Champagne é dividida em macrorregiões, e cada uma delas têm características únicas e distintas. Fiz uma matéria sobre a Côte des Bar no ano passado, e acabei não terminando de contar as outras. Então vou retomar essa série a partir daqui, com essa grande conhecida quando o assunto é Chardonnay: a Côte des Blancs.
A “costa branca” não tem esse nome à toa. Quando falamos que Champagne tem muito calcário, o famoso giz, é nessa região que ele predomina. Os subsolos são um giz branco, macio, úmido, com capacidade ímpar de armazenar água para que as raízes das videiras possam usufruir. E é bem quando essa raíz passa da terra e chega nesse subsolo, e vai se aprofundando em busca de nutrientes, que as características se mostram nas uvas, e consequentemente nos rótulos que degustamos.
Esse solo cria uma Chardonnay única, diferente de qualquer outro lugar do mundo que ela seja plantada. Ela representa 97% das uvas plantadas nessas vilas. Pinot Noir fica com 2% e o 1% restante com um pouco das outras castas permitidas em Champagne. Fica claro que a que melhor se adapta nesse terroir é realmente a rainha branca.
Além de ser parte da formação de notas na uva, esse subsolo é parte do envelhecimento do champagne. Metros e metros abaixo das construções, que as caves brancas abrigam as garrafas por anos... em uma temperatura que nunca muda o ano inteiro, variando de 10 a 12 graus, independente da temperatura lá em cima. Quando a mágica da fermentação e maturação acontecem.
Côte des Blancs abriga seis das dezessete vilas Grand Cru de Champagne. Já contei por aqui sobre os ‘crus’ e suas classificações e mudanças ao longo dos anos, mas em resumo, Grand cru é o topo da classificação de qualidade (apesar de vilas não classificadas terem tanta qualidade quanto, o que aí, envolve anos de história e batalhas, melhor resumir agora). Essa classificação se dá por vilas, e as seis são Oger, Cramant, Le Mesnil-sur-Oger, Chouilly, Oiry e Avize.
A Chardonnay nesse terroir tem uma característica de acidez, notas cítricas, frescas, e ao mesmo tempo profundas e longevas, graças a riqueza do subsolo de puro giz. Esse “chalk”, é formado por diversos fósseis desde o período cretáceo, há milhões de anos. Os pontos de retenção de água, essenciais para manter o estoque das videiras, são provenientes desses fósseis, como o Belemnite, similar a uma lula, e o Micraster, similar a um ouriço do mar. Fósseis de diferentes períodos, localizados em diferentes pontos do solo. Acontecimentos naturais que, unidos, formam esse mágico e poderoso subsolo.
A Chardonnay é a uva costuma brotar mais rápido. Seus brotos surgem antes das outras cepas, e uma grande vantagem é que quando as famosas geadas da primavera chegam, ela já está mais evoluída e não morre tão fácil quanto outras, que costumam ainda estar em fase crítica de brotação, e muitas vezes são congeladas e não resistem.
Champagne sofre anualmente com essas geadas, e em certos anos a perda de brotos é imensa, prejudicando gravemente o volume de produção. Muitas artimanhas são utilizadas para evitar o estrago, como pequenas fogueiras entre as videiras, grandes ventiladores para não deixar o gelo se agarrar aos vinhedos, e até molhar as videiras para que o gelo transforme essa água em uma capsula de isolamento ao redor dos brotos.
É muito especial poder conhecer sobre como se originam tantos sabores e aromas exclusivos dos champagnes, claro além, da expertise dos enólogos e do precioso tempo de ação das leveduras.
Se tiver a oportunidade de visitar Champagne, tire um tempo para apreciar as vilas ao redor das cidades maiores. A ida à Côte des Blancs é uma boa pedida. Meu vilarejo favorito é Le Mesnil-sur-Oger. Encantador se perder pelas silenciosas ruas, entre vinhedos e vinícolas. É de lá que vem um dos maiores champagnes conhecidos, que é encontrado para venda com limitações: Salon.
A vinícola não recebe turistas, mas você encontra o rótulo em algumas lojas de Reims e Épernay. Essa Maison é um dos exemplos que consegue mostrar a força e o potencial de guarda da Chardonnay, com maestria. A acidez ajuda na conservação, e rótulos como o 1996 que pude provar, ainda mantém essa acidez e frescor mesmo após tantos anos em garrafa.
Aproveite a vila para um almoço despretensioso no La Gare, restaurante local em uma estação de trem desativada. É sempre parte da minha rota por lá!
Champagne é um mundo inteiro em um só lugar. Infinitas possibilidades, descobertas, curiosidades e encantos. Continuo aqui contanto um pouco de cada pedacinho de lá, para vocês viajarem e brindarem comigo em cada edição! Santé!
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